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À TV, padre reforça que crianças provocam adultos com shorts curtos, diz defensoria

Postado em 28/08/2020 por

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Um dia depois da repercussão do comentário de que a menina de 10 anos estuprada pelo tio teria compactuado com o abuso, o padre Ramiro José Perotto, Paróquia São José Apóstolo de Carlinda (a 724 km de Cuiabá), afirmou para a imprensa local de Alta Floresta que considera normal a provocação de crianças de seis anos em diante a adultos, usando shorts curtos.

A informação consta em ação movida pelos defensores públicos Letícia Parobé Gibbon e Moacir Gonçalves Neto, que pedem a retratação e indenização do religioso e da Diocese de Sinop, pelo qual a paróquia é subordinada, em R$ 100 mil. Para eles, os comentários reforçam a “cultura do estupro”. Vêem também que crianças, adolescentes e mulheres vítimas de abuso foram ridicularizadas.

A fala do padre foi dada no programa Balança Geral, transmitido pela TV Nativa de Alta Floresta, filiada a Rede Record.

Os defensores citam um trecho da entrevista em que o jornalista pergunta: “o senhor acha normal esse efeito provocativo dos seis aos dez anos?”. “Sim! Eu acho (…). Eu afirmo e se alguém quiser me condenar novamente eu falo. Falo por que eu já vi. Eu trabalho há quinze anos como padre”, responde Ramiro.

“Mas de seis a dez anos, padre?”, volta questionar o jornalista.

“De seis a dez anos! Eu trabalhei na catequese e tive que mandar crianças para casa! Não ficar na catequese daquela maneira. Shortinho muito curto! Crianças. De seis, oito, nove, dez anos. Nós temos meninas que são mães aos 11 anos por opção. Nós temos! Você sabe que tem”, responde o padre no programa.

“Em outras palavras, as declarações do requerido (padre) refletem a chamada ‘cultura do estupro’, que possuí raízes no machismo estrutural, na misoginia e na diminuição da pessoa sexualmente vitimada, e repercute tanto no enfraquecimento da figura feminina como no desrespeito às crianças e adolescentes”

Defensora Letícia Parobé Gibbon

“Em outras palavras, as declarações do requerido (padre) refletem a chamada ‘cultura do estupro’, que possuí raízes no machismo estrutural, na misoginia e na diminuição da pessoa sexualmente vitimada, e repercute tanto no enfraquecimento da figura feminina como no desrespeito às crianças e adolescentes”, escreve defensora.

Antes dessa declaração, Ramiro reconheceu os comentários no Facebook, após o jornalista lê-los na íntegra, mas “não com estas palavras”. “Por isso que eu falo pra vocês. Mexeram no meu Facebook. Eu não sei como tem jeito de fazer isso”, disse. No dia seguinte da repercussão do caso, a reportagem do  ouviu o padre que também reclamou de distorções e que as mensagens possam ter sido alteradas por um hacker.

“Eu ainda coloquei que hoje nós vivemos em uma sociedade altamente erotizada, muitas crianças, elas se vestem de maneira inadequada, provocam os homens. Isso eu coloquei lá. Mas isso não faz parte do meu pensamento, do meu perfil. Eu não assumo uma postura dessa. Agora, isso aconteceu de estar no meu Facebook? E é no meu Facebook, a culpa é minha, então”, segue respondendo o padre.

A entrevista foi dada no escritório do padre, na Paróquia São José Apóstolo, que pertence a Diocese de Sinop. “O padre novamente ofendeu, de forma abstrata e genérica, tanto crianças e adolescentes vítimas de estupro, como mulheres”, aponta defensores na ação. Por isso, ela pede que a administração da igreja seja também condenada a indenizar e se posiciona contra os comentários em nota de repúdio.

Além da indenização em R$ 100 mil, os defensores pediram que a Justiça proíba o padre de fazer comentários sobre comportamento de crianças e adolescentes vinculado a prática de atos sexuais, em meios de comunicação, sob pena de R$ 10 mil para declaração.

Os defensores pediram que, caso condenado, o dinheiro da indenização vá para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, controlado pelo Poder Judiciário. Vai caber ao juiz do caso destinar uma causa ou instituição para receber a quantia.  O valor de R$ 100 mil deve ser atualizado com juros quando sair à decisão judicial.

O caso

“Duvido uma menina ser abusada com 6 anos por 4 anos e não falar. Aposto minha cara. Ela compactuou com tudo e agora é menina inocente. Gosta de dar então assuma as conseqüências”

Padre Perotto

O Padre Ramiro foi alvo de um “bombardeio” de ofensas virtuais depois publicar pelo seu perfil pessoal, no Facebook, que a garota de 10 anos estuprada pelo tio e que engravidou, compactuou com o crime sexual. “Duvido uma menina ser abusada com 6 anos por 4 anos e não falar. Aposto minha cara. Ela compactuou com tudo e agora é menina inocente. Gosta de dar então assuma as conseqüências”, escreveu em um comentário.

O comentário teve muitos compartilhamentos e o pároco foi alvo de pessoas que não concordaram com a visão. O religioso tornou privado seus perfis na rede e, em carta, pediu perdão por acusar a garota. Nesta segunda (24), o padre foi ouvido pela Polícia Civil e admitiu ser o autor das postagens que constavam em sua rede social e reconheceu que foi “desagradável e preconceituoso com relação às vítimas de abuso sexual“.

Além do processo de indenização por danos morais, o padre responde a outra ação judicial, resultado de um Termo Circunstanciado de Ocorrência aberto pela Polícia Civil de Alta Floresta. O caso foi Juizado Especial Cível e Criminal antecipou a audiência preliminar para 14 de setembro (antes, o encontro estava marcado para 22 de dezembro). O Ministério Público já foi notificada a se posiconar.

A Diocese de Sinop, pelo qual a Paróquia de Carlinda está subordinada, decidiu manter o padre na igreja, mas o proibiu de suas atividades religiosas, como ministrar missas e sacramentos.

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